POBRES PALAVRAS

15-04-2011 01:10

 

Lendo um romance, tropecei na palavra inexorável. É uma das que mantenho desconhecidas, desde rapazola quando peguei gosto de ler. Desconhecida porque, mesmo já tendo lido inexorável muitas vezes, nunca quis saber o sentido. Parece uma palavra em desuso, dessas que ficam lá nos velhos armazéns da língua, coberta de poeira, até que alguém pega e coloca numa frase como uma roupa no varal. O leitor é quem recolhe essas roupas, uma por uma, menos as que, como inexorável, a gente não sabe o que é, deixa lá, para que volte sozinha ao armazém e fique lá mofandoaté que...

Bem, desta vez fiquei com pena da pobre inexorável, fui ao dicionário. E inexorável é implacável [inflexível]. Eu já desconfiava disso, tantas vezes li que o destino é inexorável, e fiquei feliz porque o significado justifica a pompa da palavra. Porque a primeira vez que fui ao dicionário desvendar uma palavra, foi uma inenarrável (olha outra pomposa aí) decepção.

Era a palavra inconsútil. Em prosa e poesia, volta e meia lá vinha a inconsútil. Que diabo será, pensava eu, esperando um dia decifrar o enigma pela própria leitura, tantos inconsúteis se cruzando que produziriam um dia a luz do entendimento. Mas que nada, lá vinha mais e mais inconsútil e menos eu sabia o que seria. Um dia, já na casa dos quarenta, a barba começando a grisalhar, não agüentei mais aquelas três décadas de ignorância e fui ao dicionário. E inconsútil é apenas “sem costura”. Tantos mantos inconsúteis e eu não conseguia ver algo em comum entre eles para achar o sentido da palavra, e eram apenas mantos sem costura... fiquei acabrunhado (esta nem pomposa é, é atrapalhada mesmo).

Outro dia, numa festa, o cartunista Jota disse que sou idiossincrático, que era outras minhas ilustres desconhecidas.

– Mas que é idiossincrático, Jota? Eu não sei.

– Gozador.

Fiquei sem saber se eu era gozador ou se idiossincrático é gozador, o que daria no mesmo. Chegando em casa, fui direto ao dicionário, e continuo sem saber o que é idiossincrático, a não ser que entenda o que é idiossincrasia: “disposição particular do temperamento e constituição, em virtude da qual cada indivíduo sente inversamente os efeitos da mesma causa”. A definição me deixou mais ignorante! Fora isso, só diz que a palavra vem do grego.

Lembro do professor Antônio Rosinski, no Instituto Filadélfia, tentando nos motivar a aprender sufixos e prefixos gregos e latinos. O Velho Antônio era neurótico de guerra e às vezes explodia, dizia que quem gosta de ser burro devia puxar carroça e outras pérolas pedagógicas. Hoje, acho que ele teria muito sucesso apenas dizendo que, sabendo sufixos e prefixos gregos e latinos, a gente pode acertar boa parte das perguntas do Show do Milhão.

Lembro o poeta Glauco Mattoso jantando em minha casa em São Paulo e me dizendo que Glauco vem do grego, segnifica verde. E Mattoso devia ser português, falei, mas por que o “t” dobrado? Glauco tinha óculos fundo-de-garrafa, perguntou se eu não sabia que ele tinha glaucoma. Não não sabia.

– Pois é, sou um glaucomatoso – que é como se chama a pessoa com glaucoma. O “t” dobrado é só pra fazer charme.

Tirou da doença o nome artístico. Deve haver alguma palavra pomposa para designar (olha outra) isso. Por conseguinte (mais uma), lembro de inelutável. Esta foi mantida desconhecida com carinho e desvelo, mas acho que chegou a hora, é inevitável saber o que é inelutável. Vou ao dicionário, e inelutável é inevitável. Diante disso, sem querer parecer idiossincrático, e por mais inexorável que pareça, mas tão inelutável como eram inconsúteis os mantos no tempo em que não existia máquina de costura, fico por aqui.

(Pellegrini, Domingos. In: Para Gostar de Ler)

 

 

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Data: 19-02-2012

De: Mário Tokairin

Assunto: "Delitos de Brasileiros no Japão"

Estou escrevendo um livro sobre os delitos e crimes praticados pelos brasileiros que vieram trabalhar aqui no Japão. Eis, abaixo, uma dessas histórias verídicas:

Às 8:25 da manhã do dia 22 de dezembro de 2008, segunda-feira, houve uma tentativa de assalto com agressão contra a proprietária da loja de bebidas em Oizumi-machi, Província de Gunma-ken, localizada na rodovia 354, no bairo Yorikido, Japão.

As brasileiras Valéria Campos Silva Kiyota, de 33 anos de idade, e sua cunhada Ivone Junko Kiyota de Souza, de 40 anos,tentaram assaltar a proprietária da loja, senhora Horimoto de 58 anos, quando ela saía de sua mansão localizada aos fundos do estabelecimento, rumo ao Banco Gunma, carregando numa bolsa a importância em di-
nheiro de 7,6 milhões de yens, aproximadamente R$ 1,57 milhão.

Entretanto, ao ouvir os gritos da mulher, que foi agredida pelas brasileiras e já tivera a bolsa arrancada de suas mãos, o marido e demais familiares vieram em seu socorro. Eles conseguiram agarrar a que levava a bolsa e chamar a polícia que chegou em poucos minutos.
A outra foi logo localizada nas proximidades. Presas em fragrante delito, foram encaminhadas à delegacia de polícia de Oizumi-machi, cidade com aproximadamente 41 mil habitantes, dos quais 11% são brasileiros.
Valéria confessou que foi demitida da fábrica onde trabalhava e cumpria aviso-prévio a partir do dia 15 daquele mês. Residia com seu filho menor em Oizumi-machi e já tinha passagens de avião para voltar ao Brasil no dia 25 de dezembro, três dias antes de ser presa.
Ivone residia em Oyama-shi, na vizinha Província de Tochigi-ken, e estava desempregada. Alegaram que tentaram assaltar a loja porque precisavam dinheiro para quando retornassem ao Brasil. Já tinha sido inquilina num dos apartamentos da vítima Horimoto, a qual possui vários imóveis alugados aos brasileiros da cidade. E que também frequentava a loja para fazer compras de produtos brasileiros.

A polícia estranhou como as duas conseguiram descobrir o horário e o dia da semana que a proprietária da loja levava a féria do final da semana ao banco. Mesmo uma delas tendo sido inquilina e freguesa assídua da loja da senhora Horitomo, era impossível saber dessas informações.
Chegou-se a desconfiar de antigo funcionário brasileiro que trabalhou no estabelecimento, o qual já havia voltado para o Brasil.

As duas usaram capuzes para esconder o rosto, mas foram filmadas pelas câmeras de segurança da loja e do casarão da vítima. A agressão para tomar a bolsa com o dinheiro ficou claramente demonstrada, assim como as lesões no rosto da senhora Horimoto.

Elas aguardaram o julgamento presas na Casa de Detenção Feminina de Ota-shi e foram julgadas culpadas por crimes de lesões corporais e tentativa de roubo no dia 4 de junho de 2009, pela Corte da Comarca da Capital Maebashi-shi. As penas de três anos para cada uma delas seriam cumpridas na penitenciária províncial de Gunma-ken.

Os dias que ficaram detidas enquanto aguardavam o
julgamento foram descontados do total dessa pena.


Data: 13-07-2011

De: Jan

Assunto: Honrado

Caro Profº Mário Tokairin,
Fico honrado com seu comentário e participação neste humilde espaço. Seja muito bem-vindo sempre e, se não for abusar muito, peço que possa nos brindar com algum de seus textos para ser postado aqui para que outros conheçam seu trabalho. Grato mais uma vez.

Data: 09-07-2011

De: Mário Tokairin

Assunto: Cometários de Domingos Pellegrini

Você tem razão, caro amigo Pellegrini, sobre os prefixos e sufixos gregos e latinos. Eu estava um ano na sua frente no Curso Colegial Clássico do Instituto Filadélfia de Londrina, nos anos 1965 e 1966, e o Professor ( com "P" maiúscula) ANTONIO ROSINSKI era nosso professor de Psicologia e Lógica.

Ele participou da II Guerra Mundial quando fugiu da Polônia (invadida pelos nazistas e comunistas em 1939) para a Inglaterra para lutar do lado do exército livre polonês.

Mas antes de fugir, viu seus pais e irmãos serem fuzilados pelos alemães. Talvez esse fosse o motivo de você o chamar de "neurótico de guerra".

Sabe Pelegrini, tenho boas lembranças desse Professor, além do DONATO PARISOTTO, que lecionava Português, bem como nossos colegas de classe CARLOS EDUARDO LOURENÇO JORGE, ANTÔNIO CARLOS LEME DE OLIVEIRA, MIRIAM PAGLIA COSTA, JOSÉ NINO FURLANETO, etc.

Bons tempos aqueles, não ?

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